Atualmente, a humanidade adora
cerca de 10.000 deuses. Isto não significa, por óbvio, que existam
necessariamente 10.000 religiões: acontece que muitas delas são
politeístas, isto é, pregam a existência de vários deuses (ao
menos mais do que um).
Até mesmo por existirem tantos
deuses, o conceito deus varia: em características, em poderes, em
formas de agir (ou não) sobre a natureza, etc. Não é a toa que a
definição do conceito de divindade é extremamente vago. Segundo a
Wikipedia:
Divindade
é um ser sobrenatural, usualmente com poderes significantes,
cultuado, tido como santo, divino ou sagrado, e/ou respeitado por
seres humanos. Normalmente as divindades são superiores aos seres
humanos e à natureza.
Divindades
assumem uma variedade de formas, mas são freqüentemente
antropomorfas ou zoomorfas. Uma divindade pode ser masculina,
feminina, hermafrodita ou neutra, mas é usualmente imortal.
Por
vezes, as divindades são identificadas com elementos ou fenômenos
da natureza, virtudes ou vícios humanos ou ainda atividades
inerentes aos seres humanos.
Assume-se
que uma divindade tenha personalidade e consciência, intelecto,
desejos e emoções, num sentido bastante humano desses termos. Além
disso, é usual que uma determinada divindade presida sobre aspectos
do cotidiano do homem, como o nascimento, a morte, o tempo, o destino
etc. A algumas divindades é atribuída a função de dar à
humanidade leis civis e morais, assim como serem os juízes do valor
e comportamento humano.
É
também comum atribuir às divindades, ou a interações entre elas,
a criação do universo e sua futura destruição.
Contudo, meu foco neste artigo é
o monoteísmo, que é a crença na existência de apenas um deus. E,
mesmo aqui, a coisa é mais complicada. O conceito deus varia dentro
da própria religião conforme o tempo e até mesmo conforme a
pessoa. Por exemplo, hoje a Igreja Católica Romana (ICAR) aceita
perfeitamente que existam leis da natureza, isto é, regras que a
natureza imporia sem a necessidade da intervenção de deus. Contudo,
isto já foi diferente, como pode ser visto na citação abaixo.
Com
efeito, em 1277 o bispo Tempier de Paris, sob as instruções do Papa
João XXI, publicou uma lista de 219 erros ou heresias que deviam ser
condenados. Entre as heresias estava a ideia de que a natureza segue
leis, porque isso entra em conflito com a onipotência de Deus.
Curiosamente, o Papa João foi morto pelos efeitos da lei da
gravidade alguns meses mais tarde, quando o telhado de seu palácio
caiu sobre dele.
– Stephen
Hawking e Leonard Mlodinow, The Grand Design, página 15.
Pode parecer engraçado, mas
isto realmente aconteceu. Alguns poderiam dizer até que “deus não
gostou da postura do Papa e mostrou a ele”, contudo isto não
passou de pura coincidência. Uma fina e caprichada ironia do acaso,
diria eu.
A ICAR, diga-se de passagem,
sempre foi oportunista. Toda e qualquer crença que permanecesse à
sua expansão acabava sendo absorvida por ela. Isto aconteceu, por
exemplo, tanto com o Papai Noel, quanto com o coelho da páscoa.
Hoje, ela tenta pegar elementos da ciência para dar uma “roupagem
de algo confiável”, ou até mesmo para querer justificar ou provar
a existência de deus (o que também acaba a transformando, por
tabela, numa grande confusão de crença religiosa e pseudociência).
A variação do conceito deus
conforme a pessoa já funciona de forma um pouco diferente. A questão
é que, mesmo dentro de uma mesma religião, cada pessoa tem um
conceito de deus diferente, mesmo que nos detalhes.
Algumas pessoas veem deus como
um ser de infinita bondade, sem qualquer tipo de maldade.
Este tipo é o mais fácil de
refutar, bastando para isto o uso do chamado Paradoxo do Mal ou
Paradoxo de Epicuro.
“Deus
deseja prevenir o mal, mas não é capaz? Então não é onipotente.
É capaz, mas não deseja? Então é malevolente. É capaz e deseja?
Então por que o mal existe? Não é capaz e nem deseja? Então por
que lhe chamamos Deus?”
— Epicuro
de Samos
Outras pessoas já veem deus
como um ser de infinita bondade, mas com planos divinos, os quais
seriam uma espécie de mistério (ninguém sabe quais seriam estes
planos) e isto obriga-o a permitir o mal em nome de um “bem maior”.
Outras, têm uma visão muito
próxima à anterior, apenas com uma diferença: ao invés de apenas
permitir, deus seria o responsável por fazer o mal em si. Mas,
claro, sempre em nome de um “bem maior”.
A questão aqui é que esta
ideia é extremamente vaga: que “bem maior” seria este? Que
“planos divinos” seriam? Qual a finalidade disto tudo?
Quando tais perguntas são
feitas a pessoas que têm este conceito de deus a resposta costuma
ser mais vaga ainda: “deus escreve certo por linhas tortas”, ou
simplesmente “é o mistério de deus”. O que não faz qualquer
sentido, pois como alguém pode afirmar que uma criatura que sequer
pode ser conhecida existe? Afinal, ele não pode ser conhecido.
Por estes motivos, estes
conceitos são bem mais difíceis de refutar, senão pela completa
ausência de evidência de uma inteligência por trás da natureza,
ou de algo que a manipule.
Outras pessoas já veem deus
como um ser realmente mal, vingativo e a quem deve-se temer (isto é:
ele deve ser temido). Ele continua com planos divinos, os quais ainda
seriam desconhecidos.
Este conceito de deus é ainda
mais facilmente refutado, pela simples existência de ateus. Por isto
mesmo é que alguns religiosos, particularmente evangélicos, ficam
tão furiosos quando alguém se assume como ateu.
Outras pessoas já veem deus
como um ser que criou o universo, se aposentou pelo resto da
eternidade e que não intervêm na realidade.
Este conceito de deus é o dos
deístas, o qual só seria alcançado pela razão, lógica e ciência.
Segundo a Wikipedia:
O
deísmo é uma postura filosófica que admite a existência de um
Deus criador, mas não nega a realidade de um mundo completamente
regido pelas leis naturais e científicas, como pensam os ateus. Em
outras palavras, um deísta diria: Não sou ateu, mas só acredito no
que a ciência prova.
Os
deístas, portanto, não acreditam num Deus interferente, como
apregoam as religiões, nem mesmo acreditam que as religiões possam
estar certas quanto a se dizerem conhecedoras da Palavra de Deus, ou
da maneira como Deus quer que nós ajamos perante a sociedade ou
coisas do tipo. Não há quaisquer comprovações científicas da
veracidade de tais argumentos. Por exemplo, a ciência nunca provou
que o Alcorão ou a Bíblia são a palavra de Deus, e nunca provará
(principalmente porque não tem poder para tal), pois isso é algo
tido como revelação, e para os deístas não se encontra Deus pela
revelação e sim pela razão pois não aceitam nem Bíblia nem o
Alcorão como base de fé ou de doutrinas e por isso as desmerecem.
Logo, para os deístas, as religiões denominacionais são apenas
invenções humanas.
Este conceito de deus é ainda
mais difícil de refutar, pois nem mesmo a ausência de evidência de
uma inteligência por trás da natureza, ou de algo que a manipule se
aplicaria. A única argumentação que conheço que chega bastante
próximo de refutar este conceito, sem, contudo, fazê-lo por
completo, é o dragão invisível de Carl Sagan. Veja o vídeo
abaixo, que mostra exatamente esta narrativa.
“Ora,
qual é a diferença entre um dragão invisível, incorpóreo,
flutuante, que cospe fogo atérmico, e um dragão inexistente?”
– Carl
Sagan
E estes foram apenas alguns das
centenas, senão milhares, de diferentes conceitos de deus que as
pessoas têm. Eu diria que são apenas os mais comuns. Por isto mesmo
que é tão difícil refutar, de uma vez por todas, a existência de
um deus: sempre sobrará um conceito que seja ao menos um pouco
diferente e, por isto, sobreviverá.
Ainda assim, é bom que se diga:
refutar algo e provar a existência deste algo são coisas
completamente diferentes. Refutação é feita com a lógica, contudo
não se pode provar nada apenas com a lógica: são necessárias
evidências para isto. E como você consegue evidências de que algo
não existe? É completamente irrazoável. E é exatamente por este
motivo que o ônus da prova recai sempre em quem afirma (a existência
de algo, por exemplo) e nunca em quem a nega. E o mais importante é,
sempre, ver o quais são os fatos e o que eles apontam.
“Quando
você estiver estudando qualquer assunto ou considerando qualquer
filosofia, pergunte-se somente isto: quais são os fatos, e qual é a
verdade que os fatos sustentam.”
— Bertrand
Russell
Apenas um adendo final, que pode
ser levantado pelo texto: a diferença básica entre ateus agnósticos
e ateus gnósticos é que ateus agnósticos não se sentem
confortáveis em negar por completo a existência de um deus (seja
qual for), com base apenas em ausência de evidências. Afinal…
“Ausência
de evidência não é evidência de ausência.”
— Carl
Sagan
Contudo, isto não significa, de
forma alguma, que ateus gnósticos precisem ter algum tipo de “fé”
na inexistência de deus, que sejam dogmáticos, ou mesmo que eles
estejam completamente fechados para a remota hipótese de evidências
da existência de tal deus apareçam. O que muda é, apenas, a
convicção pessoal (por mais que momentânea) ou a falta dela.
“De
novo, a única abordagem sensata é rejeitar em princípio a hipótese
do dragão, manter-se receptivo a futuros dados físicos e
perguntar-se qual poderia ser a razão para tantas pessoas
aparentemente normais e sensatas partilharem a mesma estranha
ilusão.”
— Carl
Sagan
Fonte:
http://livrespensadores.net/artigos/os-diferentes-conceitos-deus/
Assista os seguintes vídeos e aprenda um pouco mais:
Assista os seguintes vídeos e aprenda um pouco mais:
O BUDISMO UMA RELIGIÃO SEM DEUS?
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